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Lascar: como foi subir o vulcão ativo do Atacama
Veja o relato e dicas importantes de quem já viveu essa aventura!
ROTEIRO
5/25/20196 min read


O vulcão Lascar é o único vulcão ativo da parte chilena do deserto do Atacama. A última grande erupção foi em 1993, mas a região ficou em alerta algumas vezes depois disso: 2006, 2012 e 2018. Fiquei cinco dias no deserto em dezembro de 2018, cerca de cinco meses depois do alerta, e em pelo menos duas vezes pude ver a fumaça subindo. Uma pessoa com um pouco mais de juízo poderia ficar receosa, mas coração de jornalista bate diferente.
É muito importante fazer esse passeio com um guia especializado porque a situação pode facilmente ficar muito perigosa.
A caminhada é uma subida de um quilômetro até o topo, mas em ziguezague. Para mim foram 4h30. Pancho, o guia do meu grupo, era muito experiente, me contou que faz o trajeto cerca de quatro vezes por semana. Ele disse que a média é essa, entre 4h e 5h. A vez que mais demorou foi quando subiu no inverno, com o caminho cheio de neve. Foram 6h30. Já a vez mais rápida foram só 45 minutos, mas era uma pessoa só e ela já era acostumada com esse tipo de atividade.
As instruções são simples:
Manter a mesma velocidade: os passos devem ser lentos e constantes. E o avanço é lento, já que os passos são curtos, mais ou menos do tamanho do pé.
Fazer bom uso do bastão de caminhada: pode parecer enfeite, mas o bastão é fundamental para driblar o cansaço. Ele ajuda a distribuir o peso para que as pernas aguentem a subida.
Controlar a respiração: o ar fica cada vez mais difícil de encontrar – e quando encontra é muito gelado, a sensação térmica no verão pode chegar a -10°C.
Manutenção do celular: o frio pode e vai congelar o aparelho, então, para evitar chegar ao topo e perder a chance de registrar, guarde o celular no bolso da blusa do meio, assim ele vai ficar aquecido.


A SUBIDA
Desde que decidi ir ao Atacama, subir o Lascar era o ponto alto da viagem. Subir um vulcão! Que experiência! Então no começo estava animada e cheia de força.
Mão direita e pé esquerdo. Respira. Pé direito e mão esquerda. Respira, não esquece.
Os sintomas da altitude misturados com o cansaço podem aparecer de várias maneiras, e eu comecei a sentir um pouco depois do meio do caminho. Quando faltava perto de 1h30 para chegar lá em cima, eu comecei a ficar com sono, o que o Pancho tinha avisado que era praticamente a única coisa que não podíamos sentir. Continuei e logo veio o enjoo. Pedi para pararmos e me sentei no chão enquanto o guia pegava um aparelho que verificava o nível de oxigênio no sangue. O normal é perto de 100, mas o meu mostrou 77. Ele sacou um cilindro de oxigênio, mas meu estômago foi mais rápido. Lá se foi meu café da manhã vulcão abaixo.
Como eu estava me sentindo melhor, continuei. Dessa vez desisti de respirar pelo nariz, que parecia que tinha queimado por dentro por causa do ar gelado, mesmo coberto pelo cachecol. Agora eu precisava ter certeza que estava respirando, então puxava ar pela boca. Eu precisava ouvir o ar entrando.
Enquanto eu focava em respirar, Pancho achou por bem puxar um papo. Por cansaço ou falta de oxigênio, acabamos mencionando Pinochet, líder do Chile durante uma ditadura que matou mais de 40 mil pessoas.
Foi aí que Panchito fez um silêncio constrangido: “Posso te contar uma coisa?”
Estamos praticamente eu e você em um vulcão no meio do deserto: “pode”.
“Pinochet era meu tio”.
“O QUÊ?! Mas, mas, irmão do seu pai?”. Depois meus amigos me perguntaram se isso fazia diferença. Não, mas eu queria saber.
“Não, era irmão do meu avô”.
“Hmm… e vocês conviviam?”. Também não muda o curso da história, mas eu tinha a chance de saber se Pinochet fazia a piada do pavê no Natal…
“Não, ele era da alta sociedade chilena”.
“Ah…”. Aí eu tive que parar com as perguntas.
Agora me diz qual a chance de eu estar no meio do deserto, quase no topo de um vulcão com UM chileno e esse chileno ser parente do Pinochet? Foi uma bela de uma distração para recuperar as forças. A essa altura, eram só mais vinte minutos até o topo.
Eu conseguia ver o final da subida tão perto, mas o passo lento deixava tudo mais longe. Como eu estava de estômago vazio e fazendo muito esforço, começou a vir o medo de desmaiar. Agora não, só mais um pouco. Eu focava só em manter a respiração, as pernas já iam sem pensar.
Quando olhei para frente de novo, vi que Pancho estava alguns passos à frente, parado, olhando em volta. Chegamos.
Li alguns relatos dizendo o famoso “é uma coisa que não dá pra explicar”. Acho cafona, mas o pior é que é verdade. A melhor maneira de tentar colocar em palavras aquela sensação absurda de vitória é: me senti tão poderosa (estilo super herói mesmo) que por alguns minutos senti até que podia voar. Saltar do topo do Lascar e sair ver todos os outros vulcões que estavam ali atrás. Tudo de cima. Com o vento de -10°C no rosto.
“Não podemos ficar muito. Está sentindo o cheiro do enxofre?”, e aí Pancho me lembrou que eu ainda estava com os pés no chão. Mas não, não tinha sentido o cheiro porque ali meu nariz não puxava ar suficiente. Mas sim, parei para reparar e parecia que eu estava em uma piscina de ovo podre. Pelo menos a solução era simples: continuar a respirar pela boca.
Sentei numa pedra, na beirada do Lascar e Panchito me deu uma barrinha de proteína. Esse foi meu banquete.
“Como estão suas pernas?”, ainda bem. “Quer que eu tire algumas fotos pra você? Não podemos ficar muito mais, precisamos descer”. Dei meu celular para ele caprichar nas panorâmicas enquanto tirei a máquina da mochila e fiz minha parte.
Essa abaixo é a vista que temos quando olhamos para dentro do Lascar. Os vulcões ali do fundo são de impressionar, mas se você olhar na parte de baixo da foto, bem no meio, vai ver um líquido amarelo, esse é o enxofre que causa tanto cheiro.


A DESCIDA
Foram quarenta minutos de descida. É como esquiar em pedras. Toda a superfície do vulcão é coberta por elas, desde aquelas que parecem areia e aquelas do tamanho perfeito pra entrar no sapato, até as que servem de banco. Todas elas pareciam entrar na minha bota.
Cada passo deixa você enterrado em pedras até o tornozelo. E cada novo passo convida dezenas de pedrinhas a dividirem espaço com seus dedos. Por duas vezes perdi o equilíbrio e acabei com grandes roxos nas pernas.
Um dos passos que saíram errado me fizeram escorregar por uns dez metros, sem perspectiva de frear.
“PANCHO!!”. E aquele pequeno chileno fincou os bastões no chão e foi minha parede para não rolar vulcão abaixo.
Quando cheguei na caminhonete, mal conseguia tirar a bota para expulsar as pedras porque minhas pernas tremiam sem controle. Pelo menos isso não aconteceu antes. Não ia ser bonito.
No caminho de volta para a pousada, estava abraçada na minha mamadeira de Gatorade, mas, caramba!, eu tinha subido um vulcão.
Lembrar disso é estranho. O tempo passa diferente. Às vezes parece que subi em vinte minutos, às vezes parece que levei dias. Só não parece que nunca aconteceu.
Eu não sou a pessoa mais atlética desse mundão, apesar de sedentária ser uma palavra muito forte, e essa foi com certeza a ideia mais desafiadora que tive.
Se eu tiver outra dessa, a gente começa outro texto.
QUEM ME LEVOU
Eu fiz todos os passeios com a Araya Atacama (https://www.arayaatacama.com/). Os grupos são pequenos e preço é bem justo. Eles passam uma sugestão de roteiro e mandam também dicas de que roupa usar em cada passeio e do que levar na mochila.
Todos os cantos do Atacama são maravilhosos e muitos turistas alugam carro para passear mais livremente. Mas eu acho que uma agência de viagem acrescenta demais na experiência. Isso porque os guias têm todas as respostas para qualquer pergunta que você pensar. Também fiquei muito impressionada de ver o quanto eles são apaixonados pelo lugar. Mais de uma vez o guia pedia para o motorista parar o carro para recolher algum lixo que os turistas tinham deixado para trás. O respeito que eles têm pelo deserto é de dar orgulho.

